Entidades
representativas de pescadores artesanais, oceanógrafos e ambientalistas
preparam um documento técnico para denunciar o Brasil
internacionalmente por causa da falta de prioridade que vem sendo dada
ao setor. Signatário de um documento que define diretrizes
internacionais para a pesca artesanal sustentável, elaborado em 2014, na
31ª Sessão do Comitê de Pesca (COFI), da Organização das Nações para
Agricultura e Alimentação (FAO), o Brasil não estaria cumprindo os
compromissos de proteger a pesca artesanal como meio de segurança
alimentar e erradicação da pobreza. A gota d'água, segundo o Movimento
dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), foi a transferência, por
meio de um decreto presidencial, da Secretaria de Aquicultura e Pesca do
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para o
Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
Em
uma carta pública, mais de 200 entidades criticaram a medida e
resumiram o histórico de abandono nos últimos anos. “Apesar da
importância social, econômica e ambiental, a pesca no Brasil sempre
esteve em segundo plano. Um país com 8 mil quilômetros de costa, 13% da
água doce do mundo e, com quase dois milhões de trabalhadores e
trabalhadoras no setor, não pode persistir usando o ministério ou
secretarias de pesca como moeda de troca entre partidos políticos do
governo sem medir as consequências que isso implica para a pesca e para
as pessoas e comunidades que dela vivem”, destaca o documento.
Os
pescadores alegam que, mesmo quando existia o Ministério da Pesca e
Aquicultura (MPA), criado em 2009, a pasta sempre foi usada como cabide
de empregos. Em uma reforma ministerial, em 2015, o MPA foi transformado
em secretaria e vinculada ao Mapa. “O MPA já não trabalhava pela pesca
artesanal. Nunca avançamos nas discussões. Quando fomos para a
Agricultura, pirou muito, porque é uma pasta voltada para o agronegócio.
Aí, sim, ficamos sem diálogo total. Começamos a perder direitos, a
documentação ficou atrasada. Agora, essa ida para o MDIC, é um tiro da
misercórdia”, comenta a secretária do MPP, Martilene Rodrigues.
O
diretor do Instituto Maramar Fabrício Gandini também acredita que a
vinculação da secretaria a um ministério que olhar para o setor
industrial é a anquilação total da pesca artesanal. “Agora é que não
haverá nenhuma prioridade.” Segundo dados mais recentes do Mapa, 917.532
mil pescadores estão cadastrados no país e cerca de 90% são artesanais.
A estimativa é que, aproximadamente, 70% do pescado que é posto na mesa
do brasileiro são oriundos do setor. Os números não são precisos porque
nem o governo sabe ao certo o volume pescado, as espécies capturadas,
os barcos em atividade ou o número de pescadores. A coleta de dados de
desembarque de peixe deixou de ser feita em 2008.
Desentendimento
O
Partido Republicano Brasileiro (PRB) foi o grande articulador da
transferência da secretaria. A intenção, segundo integrantes do PRB, é
que o comando do setor fique em um só lugar, já que o titular do MDIC é o
presidente licenciado do partido, Marcos Pereira, e o secretário
nacional da Pesca é Dayvson Franklin de Souza, afilhado político do
deputado federal Cleber Verde (PRB-MA), presidente da Frente Parlamentar
Mista em Defesa da Pesca e Aquicultura. Verde garante que o governo
terá uma atenção especial aos pescadores artesanais e as reclamações são
infundadas. “A grande verdade é que eles não entenderam a mudança. Ela é
justamente para fortalecer a atividade. A crítica é uma reação natural à
qualquer alteração, mas é uma questão de diálogo. O tempo vai mostrar
que temos razão e a gente vai dar respostas. Queremos organizar e
garantir direitos àqueles que são detentores de benefícios.” Procurados,
o Mapa e o MDIC não responderam aos questionamentos da reportagem.
Fonte:
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2017/03/16/internas_polbraeco,581442/pescadores-artesanais-querem-denunciar-o-pais-por-falta-de-atencao.shtml